sexta-feira, 27 de novembro de 2009

... (parte 3)

e chegou o sol :D

desde domingo, que temos finalmente o sol, já deu para andar de bicicleta, e ver aqui as redondezas melhor e também já deu para ir até maputo.

está a ser bem melhor.

também já sei os nomes dos miúdos todos que cá estão, são 21 ao todo, e todos os que cá estão são mesmo orfãos de pai e mãe. muitos deles são irmãos entre si.

aproveito para pedir já desculpa pelos erros que vou dar a escrever isto porque não tenho dicionário no notepad aqui... e como desde a primária que dou montes de erros, não me parece que vá mudar agora...

bem começando pelo inicio.

a cena do segurança fez-me um bocado de confusão, não foi também um susto assim tão grande, mas dava outra realidade à coisa, visto que eu não acho isto aqui nada pouco seguro.

no entanto em conversa sobre o segurança e os motivos de porquê eles terem segurança privado, pois parece que só num ano tiveram 8 assaltos, alguns deles, dizem eles, com colaboração da policia.

existem gangs próprios para assaltar missões, e coisas do género. vendo por este ponto de vista, qualquer segurança é pouca e seu eu vivesse cá todos os dias também iria querer estar o mais seguro possivel.

a parte da colaboração da policia não aprofundei muito a coisa, mas eles dizem que havia provas que o comandante daqui da zona estava metido nas coisas, fizeram queixas junto do ministério, chegaram a ter audiências com o ministro e tudo, segundo consta o comandante foi mudado para outra zona com mais população, ou seja no meu ponto de vista promovido... é sempre positivo.

consegui perceber também que o segurança não é sempre o mesmo :P

bem continuando.

até sábado não fiz grande coisa, dei aulas, chovia sempre sempre, e o meu ipod decidiu dar-lhe o amoc e deixar de funcionar... foi o semi-pânico...
é que para além do ipod, tinha trazido 3 livros para ler, mas na 6ª já os tinha acabado todos.

eram eles:

"Equador" do Miguel de Sousa Tavares, que eu odeio como pessoa e recuso ler qualquer coisa dele, mas sendo o primeiro livro que leio dele, fiquei agradavelmente surpreendido, preferia não ter gostado...
é assim um romance à lá Maias, obviamente pra pior, mas adorei o fim... e a história está boa. o único senão é que as personagens na minha cabeça eram as que via dos genéricos da tvi... mesmo sem ter visto a novela, fiquei com as imagens dos personagens na cabeça o que estraga um bocado a coisa.
depois li ainda o "Dias Exemplares", do Michael Cunningham, que é assim das cenas mais freakish que tenho lido nos últimos tempos...
antes destes, acabei de ler, "Liberal à Moda Antiga" do Francisco José Viegas que é um livro de encher chouriços... aglomerados de artigos dele... uns bons, outros completamente parciais... o costume, é sempre bom ler cenas com as quais não concordo muito e outras sobres as quais nem opinião tenho, só para tentar ver outros pontos de vista das coisas...

bem sendo que sexta choveu choveu choveu, e os italianos voluntários que cá estavam também, foram embora à noite, levaram o mau tempo com eles...
desde sábado que estou cá sozinho como voluntário, chegará novamente gente em Janeiro.

no sábado de manhã, estive na conversa com os miúdos pelo centro, tentar conhece-los melhor, mas estava um bocado mais a entrar em pânico com o não ter nada para fazer e o estar aqui no meio do nada, longe de tudo e sem contacto com quase ninguém, mas à hora de almoço veio o sol, e isso mudou tudo completamente.

com o sol parece que a disposição de toda a gente mudou para melhor, pelo menos a minha mudou...

depois de toda uma semana de chuva já só se queria ir à rua, por isso fui logo com os miúdos mais velhos dar uma volta de bicicleta, a distribuir uns flyers, feitos por eles, para uns cursos de informática que vão dar cá.

fugindo um bocado, o porquê do cursos:

o irmão alexandre, é o director do CIM, não sei porque não é padre, mas não é, toda a gente lhe chama irmão alexandre.
dizia, o irmão alexandre, esteve a explicar-me à hora de almoço, um bocado por curiosidade minha, depois da informação que tinha recolhido dos miúdos, os planos que eles tinham para eles cá no centro, como funcionavam as coisas, etc.
isto porquê, estava à espera de encontrar miúdos mais jovens, mas estão cá muitos à volta dos 18-20 anos...
portanto teoricamente eles só poderiam cá ficar até terem 18, mas existem muitos que cá estão e até já trabalham.
o plano do irmão para eles é ficam até arranjar uma maneira de poderem sair em condições...
para estarem cá têm é de estar a trabalhar ou a estudar.
só um está a trabalhar, o manuel, tirou um curso profissional de técnico de refrigeração e está a trabalhar numa empresa faz um ano, estão à espera de o estado que teoricamente vai dar umas parcelas de terreno, para eles (com a ajuda do CIM) fazerem umas casas e irem à vida deles... eles os mais velhos.
o manuel está portanto bem encaminhado.
o eugénio está a estudar direito, também estão à espera de terreno para a casa deste, e tem o curso a ser pago por um "padrinho" de italia. ainda é caro, 3.000€ ano.
depois existe o calisto que tirou um curso de cozinheiro e estão a tentar arranjar trabalho para ele. depois disto sobram 2 assim mais velhos também que é o alberto e o estevino.

o estevino ainda não percebi a situação dele, mas parece-me mais limitado na escola, deve ter começado muito tarde.

o alberto vai fazer uma coisa do género de pré-universidade. fazendo 2 anos, antes de depois começar o curso mesmo em si.
como em portugal estas coisas também aqui são caras, sendo uma privada e tudo, paga uns 750€ por ano, por isso é que precisa de auto-financiar-se, daí os cursos de informática.

a condição deles estarem aqui é se estão a estudar até ao 12º não podem chumbar, isto para os maiores de 18, se estão a trabalhar é tentar arranjar-lhes uma casa.


bem portanto estava eu a chegar de almoço no sábado e o alberto veio perguntar-me se eu queria ir com eles distribuir os panfletos... mortinho por sair daqui, aproveitei logo.

fomos buscar umas bicicletas, a minha era bem velhinha do género duma pasteleira, e bora de pedalar.

tal como vim depois a confirmar, Marracuene é bem bonito, era no tempo dos portugueses o ponto de turismo daqui dos arredores de Maputo, teria até hipopótamos, e coisas assim.

a casa de verão do governador de Portugal em Moçambique era aqui. tem assim uns ares de savana e campo com um rio grande à beira, com o oceano lá no fundo.

vai então na volta de bicicleta o primeiro passo é ir até à escola onde eles estudam a ver as notas. só para contextualizar... choveu uma semana inteira. moçambique tem UMA estrada nacional, que liga maputo até à cidade mais lá na ponta de cima, isto sempre junto ao litoral.
Marracuene tem alcatrão muito velho, e só no centro da vilazinha onde estou, devido ainda ao tempo português.

indo então a caminho da escola, e passando no meio dos buracos e da lama, chego ao que é um descampado com barracões ao fundo... um deles diz, directoria... ok é isto a escola...
escola que segundo o irmão é a melhor daqui da zona... não tem assim tão mau aspecto quanto isso, mas pronto não sei também o que esperava. consigo agora perceber porque querem eles abrir no centro uma escola até ao 12º. as condições no centro são muito melhores. a escolaridade "obrigatória" em moçambique é até ao 7º, obviamente que ninguém quer saber se fazem ou não a escola.

chegado à escola altura de dividir cada um para seu lado a distribuir as folhas, obviamente que fui atrás dum deles, o alberto, porque não conheço nada aqui... onde é que vamos pergunto eu, é já aqui diz ele...

fomos em direcção à estrada nacional, fazemos uns 500 metros, onde dá para ter uma noção dos carros deles, tudo podre e apinhadissimos... e vai de virar para uma estrada de terra batida, tudo normal.

começa a andar na estrada e casas ali perto nem vê-las... anda anda anda, desvia de buraco, pedala na lama, pedala na areia, pedala ainda mais, andamos uns 30 minutos se passamos por 10 casas foi muito, gente na rua nem ver, então não distribuímos panfletos a ninguém. os panfletos são folhas A4 feitas a computador que basicamente dizem curso de windows e office, 800 Mts.

passado essa meia hora ou mais, ele para... entrega um flyer a um gajo que estava sentado à porta duma casa e eu aproveito para perguntar se ainda falta muito, etc...

ele diz que não, é isto já cá estamos, portanto estamos no meio do nada, onde só existe campo e duas ou três casas, de gente que nem se vê porque as casas ficam longissimo da estradinha por onde íamos...

eu olhei para ele... e ele deve ter percebido a coisa porque me disse, vamos mais pro meio do bairro agora, viramos então para o meio dum caminho de cabras que lá havia e vai de pedalar...

passamos por ervas, lama, lixo, e começam as primeiras palhotas... e eu penso de casas sem ninguém e zonas desertas para sítios onde nem electricidade deve haver... marketing ou product placement não é o forte dele...

mas ao menos já havia gente a querer as folhas, ou pelo menos gente a quem as dar.

pormenor interessantíssimo é fazerem isto sendo brancos... até aqui desde que sai do CIM tinha visto 1 branco só... é as caras que eles fazem quando passa um branco de bicicleta no meio do nenhures... não é que não estão habituados a brancos, mas não se devem vê-los por ali muito, muito menos a distribuir papeis...

por entre ruas e ruelas, quando dou por mim e passado à vontade 1h, estava completamente morto de cansaço já, dou por mim e estamos de volta à escola... e sem folhas já.

pensando para comigo, não te vais auto financiar nunca na vida por aqui, digo-lhe que vou voltar para o centro, e ele diz-me eu vou também, para te levar a ver a "vila".

fomos 5 andar a distribuir os papeis, separa-mo-nos na escola e quando voltamos lá eles também já andavam de novo por ali.
alguns ainda ficaram a passear por ali, fui só eu e o alberto ver a vila.

a vila não é mais que casas decentes, para o padrão, com estação dos correios, onde tenho de ir enviar uns postais qualquer dia, complicado vai ser encontrar, um sitio onde se apanha o barco para ir à praia, e uma estação de comboios.
vi também uma feira, uma espécie de praça, mas em vez de bancadas eles têm tudo no chão.

foi divertido, e ver a malta a olhar quando se passa é sempre giro, deu para ver o sitio, sair do centro e estar sem pensar em nada, deixar um bocado absorver a sensação de estar aqui no meio do nada, fora de tudo o que é "normal".

e ao contrário do que tinha previsto, até deu resultado porque já apareceram 5 ou 6 miúdos a perguntarem pelo curso e a quererem inscrever-se... portanto tenho de me calar +-... nunca iria acreditar que malta que não sabe ler nem escrever, não tem electricidade em casa, fosse tentar meter os filhos em cursos de computadores mas pelos vistos metem.

voltando ao centro o meu sábado ficou basicamente feito. domingo também foi passado meio na conversa aqui pelo centro com os miudos, estive também em estudo do meu ipod e deixei-me vencer por ele, na esperança que se não lhe mexer e com o tempo ele voltasse a si... acabou por funcionar que ontem segunda ficou bom, tinha ficado sem carga completamente e não aceitava carga nova e o computador não o reconhecia... passado um dia depois de 2 dias a tentar voltou a funcionar... perfeito.

segunda feira uma grande aventura, depois da aula normal, vamos à cidade, porque tenho de ir buscar uns cds que mandei vir de lisboa pela minha tia, para lhe dar uns programas, tipo photoshop, etc...

quando vamos a sair do centro para ir a maputo, o jorge que é irmão do alberto, está a tirar uma espécie de curso profissional na escola superior de turismo ou algo do género, pediu para vir também, a minha tia só ia estar despachada às 15.30 e o irmão que ia comigo tinha de ir às compras de material para as obras.

quando fomos a sair o irmão perguntou-me se eu sabia conduzir, e tinha carta e queria levar o carro... disse logo que sim.

foi assim qualquer coisa de surreal... nunca tinha conduzido do lado contrário e meter mudanças com a mão esquerda... o atrofiou... e o pisca que é do lado errado também e a cada cruzamento fazia com que ligasse o limpa para-brisas... foi espectacular...

e os gajos são loucos a conduzir cá e os peões ainda pior que andam quase no meio da estrada. só conduzi um bocado porque ao pé do estádio em construção, existe um posto fixo de controlo da entrada e saída de maputo... como não tinha passaporte comigo, esqueci-me dele no CIM, troquei e fui pro lugar do pendura.
mesmo assim continuou a ser uma viagem surreal.

parecia que tinha chegado ao 3º mundo, montes de gente a andar à beira da estrada, não se via cidade em lado nenhum, ou centro da cidade, era só pessoas à beira das estradas, mercados improvisados e campo a todo o lado... lixo, poeira, pessoas e campo.

de repente o transito começa a ficar cada vez pior, deixa de haver a noção de faixa e temos montes de carros parados nas bermas, barracas de cimento em tudo o que é lado, os famosos chapas, que são mini camionetes de 12 ou 13 pessoas onde vão uns 20 de cada vez, e carros velhos, pessoas em todo o lado.

é assim durante kilometros, à vontade uns 15 minutos de casas, lixeiras a ceu aberto, espécies de canais sem água e trânsito, trânsito por todo o lado.

entramos lá para uma ruazita e estamos numa espécie de AKI cá do sitio.

já se vêm alguns brancos por aqui, mas muito poucos, compramos o que era preciso, e segue para o outro lugar.

agora ia-mos buscar umas pilhas, daquelas dos relógios de pulso, para um jogo do género de nitendo ds mas daqueles antigos.

lá voltamos à confusão e de repente começam a ver-se prédios muito muito lá ao fundo... era a avenida eduardo mondlane, um dos que lutou contra portugal pela independência vim a descobrir.
tem uma estátua onde estava uma estátua antiga de lourenço marques.

é uma avenida bem grandinha, +- plana, fez-me lembrar belgrado pela sujidade/poluição e assim um ar degradado. é como se tivesse parado nos anos 70, e parou.
eu não sabia mas moçambique é desde a independência, não sei se agora ainda é, um regime semi-comunista.

antes de ir às pilhas era altura de ir a casa da minha tia, que fica numa zona chamada museu, porque é ao pé do museu de historia natural.

à ida para lá passei por montes de chapas que diziam museu/benfica. benfica também é uma zona de maputo. sporting não há, tenho visto bué pretos, já vi mais de 10 à vontade com camisolas do porto... do sporting e benfica é que ainda nada.

enquanto eu estive a falar com a minha tia e ela esteve-me a mostrar o sitio onde está agora, o irmão foi mais o jorge a uma piscina que há ali perto pois quer meter os miúdos na natação porque eles não sabem nadar...

a minha tia, é missionária faz já 25 anos e quase que desde que eu me lembro de ser eu que ela está em moçambique.

lá me deu uns cds e uns livros de informática, que tinha pedido ao meu pai para enviar para ela e de seguida fomos até ao porto, porque o irmão tinha recebido um telefonema dum amigo importador italiano, que tinha umas coisas para lhe oferecer, era uns biscoitos que já não podiam ser vendidos devido à brevidade da validade.

depois de irmos ao porto fomos então buscar as pilhas, que ficava algures na cidade, ao pé duma avenida que se chama Ho Chi Min em memória dum chinês qualquer. não sabia, mas Moçambique foi governado por comunistas, ainda é mas agora já é mais soft, então tem montes de ruas em homenagens a lideres comunistas tal como este ho chi min, depois estaline, lenin, markx, mao, etc...

depois das pilhas era altura de voltar para o centro e o irmão decidiu levar-nos por um atalho pelo meio dos bairros mais pobres, segundo consta é também bom para fugir ao trânsito.

fizemos então uma rua junto à linha de comboio, durante uns 20 kms, onde não se viu mais nada que barracas... nuns sítios em mais concentração que outros, no entanto só barracas. nesta ida junto à linha de comboio, em que passei por mahotas, que é um bairro onde a minha tia já esteve e alguns dos miúdos daqui do CIM são de lá, passei por uma cena à beira da estrada engraçada, que foi um preto e uma preta sentados numa árvore, assim uns gajos duns 20 anos +-... devia ser uma espécie dum date mas o engraçado é que o preto tinha uma camisola do porto, devia ser a roupa mais fixe dele.

após mais uns quantos quilometros, em que passei na estrada onde tinha andado de bicicleta, mas sem me aperceber disso ao inicio, chegamos de novo ao centro.

durante a viagem deu também para ver pela primeira vez o oceano indico, quando passamos por uma zona que era uma espécie de marginal cá do sitio, chamada costa do sol.
é onde tem também umas discotecas acho. pelo menos bares tem.

tal como já tinha dito com o sol voltou mesmo a normalidade.

o meu ipod já funciona, o sporting já ganha, tudo parece estar bem... vamos a ver este fim de semana :D

o vialonga também lá segue imparável, 3 jogos seguidos a vencer, 2 vitórias em 2 jogos desde que me fui embora :)

bem isto já vai longo e ainda tenho coisas para contar, mas depois escrevo mais que já estou farto.

latter ;)

2 comentários:

  1. Hello Prof. Miguel! :)

    Fico feliz por saber que te estás a habituar bem aí ao sítio.
    Espero k tenhas muitos dias de sol pois assim é bem melhor.
    O mail do Diogo é: "diogocarvalho5@hotmail.com".
    Vê se consegues colocar fotos no blog pois assim o teu "diário de bordo" tornava-se ainda mais interessante.
    Espero que tenhas muito sucesso nas tuas aulas de inglês e nos cursos que leccionarem para que todos os miúdos do CIM possam ter acesso à universidade que pretendem.
    Vai relatando as novidades pois assim vamos recebendo notícias tuas.
    P.S.- Espero que tenhas tempo para o teu banhinho de meia hora... lol. Tou a brincar. Temos de poupar a água...

    Grande abraço

    Flávio Frazoa

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  2. eu comigo está tudo bem :)

    cá vou andando uns dias com mais vontade de escrever outros com menos.

    os putos lá vão andando no seu inglês, mas são muito preguiçosos...
    dizem que sim a tudo mas depois se lhes pergunto as coisas outra vez não se lembram de nada...

    é preciso muita paciência mas cá se vai andando.

    quanto aos banhos, meia hora não, mas 10 ou 15 minutos dá na boa, também como não faz frio não dá vontade de banhos de água quente de 30 minutos :P

    as fotos estão a caminho...

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